quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

CÃO


Quero falar sobre um cachorro. Não é meu cachorro de estimação, não morreu, nem saudades, nem nada disso. Muito pelo contrário. Não cultivo nenhuma estima por aquele ser peludo, que insiste em apavorar a vida da minha família. Suas ações terroristas sempre acontecem no caminho entre a nossa casa e a da minha mãe...
Bom, mas vamos começar do começo. Pelo que me lembro, a aversão que este cão tem para comigo não foi sempre assim tão intensa. Acho que ele aprendeu a me odiar com outro cachorro. Este sim, apresentava uma raiva tão fortemente arraigada em cada nervo do seu corpo, que dava até gosto de ver. Colava a cabeça repleta de dentes nas grades do portão... Para minha felicidade, nunca realizou o seu desejo ardente de arrancar qualquer pedaço do meu corpo, mas penso que deve ter dito – em cachorrês, é lógico – algo para o outro, cão de rua, peludo, que sempre perambulava por ali, coisa do tipo: “Pega esse maldito sujeito que vive passando aqui em frente, no nosso território. Só não faço eu mesmo porque tem esse maldito portão...”.
E a ordem foi seguida, à risca. Sorte que o cachorro sem dono tem um porte pequeno, mas nem tanto... Porém se fosse do tamanho e com a força do seu mestre, que ordenou o ataque à minha pessoa, ah! Aí eu estaria frito!
Sobre mim as suas investidas não me metem medo. Já dei umas carreiras nele. Correu com o rabo entre as pernas. Os latidos saíram esganiçados, meio que sumindo pela boca assustada. Ficou uns tempos respeitoso. Quando eu passava pelo que ele julga ser seu território, na calçada, não ousava se aproximar... Porém, com o tempo, acabou perdendo o medo e recuperando a coragem.
O odiento ser peludo reina no terror contra minha família, principalmente com a minha esposa e minha filha. A rotina delas foi alterada, evitam aquele trecho da calçada, passando do outro lado da rua ou até dando a volta no quarteirão... Quanto a mim, não mudo a minha rota. Se o faço, é somente para acompanhá-las. Mas não adianta, aquela coisinha raivosa e peluda não tem jeito, cismou com a gente... Acho mesmo que o problema é só comigo.
Porém acabei tomando uma decisão. Quando ele começar a latir e vier se aproximando, eu simplesmente vou parar e esperar. Só isso. Até ele se cansar de me odiar. E se ele ousar me morder, se ele encostar em mim, aí então levará um chute que vai se lembrar pelo resto da vida.
Só que depois desta decisão, nunca mais encontrei o ousado e insano cão. E isto já faz um bom tempo... Chego até apensar que o dito cujo morreu... Mas se ele ainda estiver no reino dos vivos, na próxima ocasião em que nos encontrarmos a nossa questão será resolvida de uma vez por todas. Ah, com certeza da próxima vez não passa.