quinta-feira, 15 de junho de 2017

A DOSE CERTA

Outro dia fui comprar um remédio pra enxaqueca e não achei em nenhuma farmácia. Bem que o médico, ao receitar, desconfiou que não mais estivesse disponível. “É um remédio antigo”, disse ele. Também não encontrei nenhum equivalente. A substância não é mais fabricada, foi o que sentenciou o rapaz da drogaria, após consultar aquele livro cheio de nomes de remédios, que lembra as listas telefônicas de antigamente, só que mais fina.
Este insucesso me fez pensar uma série de coisas...
As listas telefônicas, tudo bem, não há problema algum que não sejam mais fabricadas, mas este remédio, a minha esposa fez uma pesquisa na internet, encontrou vários comentários de pessoas se queixando que este era o único remédio que funcionava, que os outros que vieram depois não resolvem como o antigo medicamento.
Tem um remédio que funciona? Então vamos tirá-lo de circulação. Não pode ser cem por cento. É preciso manter uma dose, um índice de doença latente na população. Porque assim o sujeito vai consumir mais drogas, outros medicamentos, vai trocar as substâncias, as mais novas sempre mais caras.
Este novo produto não pode durar muito. Temos que dar um jeito de fazê-lo quebrar logo após o término da garantia. Porque assim o consumidor vai comprar outro, gerando mais lucro para a empresa.
Já ouviu dizer que o câncer tem cura? Já viu notícia de carro movido a água? Será que são mentiras? Por que estas coisas surgem e logo desaparecem, sem ganharem a repercussão e atenção que merecem?
Até que ponto o dinheiro e o interesse lucrativo de certos mercados vão dar as cartas no jogo da vida? Quais são os valores que movem as pessoas, as empresas, a sociedade?
Vamos cortar funcionários. Quem? Corte aqueles que ganham mais. E assim é feito, sem a mínima preocupação em saber se este é o critério mais justo.
Já temos tecnologia para fabricar um aparelho com esta lista completa de recursos, mas não vamos lançar tudo de uma vez. Criaremos várias versões, uma depois da outra. Os consumidores vão querer e comprarão todas elas, sedentos pelos aumentos progressivos de recursos e facilidades.
Os transgênicos e agrotóxicos na agricultura não são saudáveis? Os antibióticos e o estresse a que são sujeitos os animais na pecuária e na avicultura prejudicam a nossa saúde? Que importa, se dão mais lucros?
Acordo de Paris, para que os países reduzam a produção e uso de energia fóssil e a troquem por energia limpa? Não! Isso vai prejudicar minhas indústrias!
Nicola Tesla foi um cientista e inventor incompreendido no seu tempo. Queria inventar uma fonte de energia gratuita, disponível para qualquer pessoa, obtida por uma espécie de indução. Não precisa nem dizer que esta ideia humanitária lhe ocasionou a perda do investimento.
Dizem que isto tudo faz parte da Lógica Capitalista. Mas eu acho que dá para ser capitalista sem cometer estes excessos. Sou otimista, acredito que um dia acertaremos a dose do capitalismo, mas até lá perderemos nossas doses de remédios. E outras coisas mais...

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